Despertar CEBI | Set. 2020 | Sempre na linha da frente

São mais de 5000 as Organizações da Economia Social nacionais que trabalham incansavelmente para assegurar respostas absolutamente fundamentais para o país e para melhorar as condições de vida de milhares de pessoas. A Fundação CEBI orgulha-se de pertencer a esse reduto resiliente de Organizações que pretende criar uma sociedade mais solidária e inclusiva. Em pleno Estado de Emergência e de Calamidade, foi necessário reavaliar e reajustar o Desenvolvimento Humano. Ouvimos 26 protagonistas deste capítulo único. Diferentes vozes, em representação de tantas outras. Registámos os seus testemunhos nesta edição inédita e surpreendente, que conta com a colaboração das áreas de atividade da Fundação: Educação, Social, Saúde e respetivas áreas de Apoio à Intervenção. Um trabalho interdepartamental, articulado superiormente, que gerou sinergias e continuou a pretender acrescentar valor às Comunidades que servimos.

Trimestral • Ano 38 • Setembro 2020 • Diretor Nuno Lopes Fundador José Álvaro Vidal • Número 362 • Preço 0,50€

SEMPRE NA LINHA DA FRENTE

São mais de 5000 as Organizações da Economia Social nacio- nais que trabalham incansavelmente para assegurar respostas absolutamente fundamentais para o país e para melhorar as condições de vida de milhares de pessoas. A Fundação CEBI orgulha-se de pertencer a esse reduto resiliente de Orga- nizações que pretende criar uma sociedade mais solidária e inclusiva. Em pleno Estado de Emergência e de Calamidade, foi neces- sário reavaliar e reajustar o Desenvolvimento Humano. Ouvimos 26 protagonistas deste capítulo único. Diferentes vozes, em representação de tantas outras. Registámos os seus testemunhos nesta edição inédita e surpreendente, que conta com a colaboração das áreas de atividade da Funda- ção: Educação, Social, Saúde e respetivas áreas de Apoio à Intervenção. Um trabalho interdepartamental, articulado superiormente, que gerou sinergias e continuou a pretender acrescentar valor às Comunidades que servimos.

diremos sempre “sim” a

Apesar dos vários alertas, que vinham sendo dados desde o final de 2019 pela OMS, na sequência do surto pandémico ocorrido na China, apenas em fevereiro de 2020 fomos todos confrontados com uma situação sur- preendentemente alarmante, a pandemia provocada pelo coronavírus, que origina a doença Covid-19. A Fundação como um todo “reagiu imediatamente” a esta devastadora ameaça, através de um Plano de Contingên- cia, com base nas orientações das Autoridades da Saúde e da Segurança Social. Este Plano foi implementado em todos os Departamentos e valências da Fundação, no dia 9 de março, a que se seguiram vários Comunicados de procedimentos específicos, tendo em vista a proteção de utentes e trabalhadores e encetar, como referi, um combate sério e dirigido, a esta pandemia. Tivemos que tomar decisões e organizar a Fundação, de imediato, para duas situações distintas: medidas a tomar para as atividades que “tinham de ser suspensas” por decisão governamental e manter e garantir toda a segurança possível nas atividades que “não podiam” parar. Quisemos que esta edição temática da “Despertar CEBI”, fosse dirigida precisamente à pandemia e explicasse com pormenor como a enfrentámos, melhor dizendo, como a estamos a enfrentar.

educar tratar proteger alimentar acarinhar sorrir

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Álvaro Vidal, de cidadãos comprometidos com o futuro e conscientes do importante papel que irão desempenhar no desenvolvimento do país, das regiões onde irão estar inseridos, das famílias que irão constituir, e do mundo em geral, porque como dizia Madre Teresa de Cal - cutá “o que eu faço é uma gota no oceano. Mas sem ela, o oceano será menor.” A Fundação CEBI irá, a breve trecho, concre- tizar mais um projeto: a construção de um novo Lar em Alverca, já anunciada, que substi- tuirá o atualmente existente, e que pretende vir a ser uma Unidade moderna, e por conse- guinte adaptada aos novos padrões e necessi- dades da Comunidade Sénior. Queremos que este se constitua como mais um momento de orgulho para todos nós que “somos” parte da Família CEBI: Órgãos Sociais, Colaboradores, Utentes, Familiares de Utentes, Fornecedores e Amigos, enfim, todos os que se sentem como tal. Deixo, aqui, a garantia de que continuare- mos empenhados, esforçados e focados no nosso trabalho diário, em prol da melhoria da quali- dade de vida de todos os que em nós acreditam e que nos confiam diariamente a “vida” dos seus entes mais queridos, Filhos e Pais. Refiro por último, mas não menos importante, a nossa preocupação e missão para com os mais desfavorecidos, que ao longo dos anos temos vindo a acompanhar e apoiar, e que pelas expe- riências vividas, na maior parte das vezes já não acreditam que “viver com qualidade é pos- sível”. Mas será. É só cada um de nós querer. Não prometemos resolver todas as situações, mas garantimos que diremos sempre “SIM”, quando as palavras forem Educar, Tratar, Pro- teger, Alimentar, Acarinhar e também “ensi- nar” a Sorrir.

Ao longo desta edição, terão oportunidade de ler os testemunhos de Mulheres e Homens, Dire - tores, Técnicos, Terapeutas, Educadores, Pro- fessores, Auxiliares de Ação Direta e Famí- lias, que com o seu empenho e dedicação nos ajudaram nesta missão, que tenho a certeza nos tornou ainda mais fortes. Contámos, assim, com o enorme empenho e dedi- cação dos nossos Colaboradores, que recriaram novas formas de trabalhar: os que se manti- veram na linha da frente, garantindo o cum- primento rigoroso dos procedimentos estabe- lecidos no referido Plano de Contingência, com redobradas atenções e apoio a todos os nossos utentes, e os colaboradores das linhas de retaguarda, sem os quais não seria possível levar por diante esta “batalha”. Quero deixar aqui um reconhecido agradeci- mento a todos, em particular aos Coordenadores que lideraram as Equipas. Saliento, também, a presença e a dedicação do nosso Diretor Geral, que esteve sempre “no terreno das operações”, tendo sido essencial na orientação às equi- pas, e no apoio ao Conselho de Administração, nos momentos de tomada de decisão sobre as políticas que foram estabelecidas. Afirmo com segurança, que ficamos todos muito melhor preparados para garantir que esta Casa, com mais de 50 anos ao serviço das Comunidades envolventes, irá no futuro continuar a manter a sua Missão e Visão, garantindo a manutenção dos Valores e Princípios que tem “bem enrai - zados” desde a sua constituição, cada vez mais com a certeza de estar a prestar serviços de maior qualidade, e portanto a participar na construção de um mundo melhor. Estamos convictos de estar a contribuir para a criação, principalmente no Colégio José

ANA MARIA LIMA Presidente do Conselho de Administração

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O Ano Letivo 2019/2020 foi planeado e cons - truído assumindo a necessidade de mudança relativamente ao paradigma associado aos pro- cessos de ensino e aprendizagem. Ambicionava- -se implementar gradualmente um modelo cuja estrutura curricular incrementasse a valoriza- ção das necessidades e interesses das pessoas que se desenvolvem e aprendem. Por isso mesmo, no Colégio José Álvaro Vidal, “redesenhava - -se” o conceito de Escola desde o início de setembro, com uma visão onde cada vez mais os alunos passavam a ser participantes ativos e construtores da sua aprendizagem. Em plena interação com o meio, articulando e convocando os saberes e competências para um conhecimento mais integrado, fomentava-se a autonomia e o ensino cooperativo, valorizava-se uma relação pedagógica sólida e dinâmica, que assenta numa metodologia de trabalho que prioriza o desen- volvimento do indivíduo na globalidade. Ninguém esperava, no entanto, uma realidade onde estivesse incluído um “Ensino à Distân- cia” e uma reconstrução tão profunda da forma de ensinar, com metodologias que nunca tinham sido verdadeiramente testadas e onde a resi- liência de toda a Comunidade Escolar assumiu o papel principal deste capítulo. À capacidade de encarar a mudança, juntou-se a diversidade, o foco e a inclusão, parceiras fortemente inter- ligadas, numa altura onde a disponibilidade, o espírito de equipa e a aprendizagem se revela- ram também primordiais. Para Educadores e Professores, foi consen- sual: “no início foi um desafio desmedido”. A começar pela rapidez com que tudo mudou. E todas as adaptações e ajustes que daí emer- Um capítulo que nunca havia sido escrito Diversidade. Foco. Inclusão. Resiliência. Novas formas de ensinar. Construtores de conhecimento. Aquisição de competências.

É UM CONJUNTO DE APRENDIZAGENS QUE IMPLICA INEVITAVELMENTE A PRESENÇA FÍSICA

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giram. Mas, hoje é mais certo, a tipologia de Escola que já se vivia na CEBI ajudou, em muito, a ultrapassar a maioria dos desafios que pareciam não ter fim – “a simples aquisi - ção de conteúdos já não era, há muito tempo, o mais importante da Escola que se vivia aqui”. Explicou-o o Diretor Pedagógico do Colégio José Álvaro Vidal, Pedro Oliveira, acrescentando de imediato que “as institui- ções de ensino que funcionavam apenas com aulas expositivas, falharam redondamente” neste período. A gestão flexível do currículo, afirma, “que já trabalhamos com os nossos alu - nos há mais de dois anos, permitiu-nos ter uma gestão menos rígida no trabalho a reali- zar” e, por isso, mesmo neste tempo diferente “houve construção, progresso e desenvolvi- mento” nos estudantes. Seguramente. “Ao nível da aprendizagem, sabemos que muito se centrou na aquisição de competências”, disse o Diretor Pedagógico. E não será isso o mais importante? “Já há mais de 20 anos que, no Colégio José Álvaro Vidal, temos noção que o currículo formal é insuficiente”. O Portu - guês e a Matemática, apesar de muito rele - vantes, não chegam. “A formação de cidadãos implica a aquisição de competências para a vida”. Até porque, na realidade, “ninguém sabe como vão ser as profissões do futuro”.

presenciais levantou, entre outros desafios, um compromisso ainda mais vincado com “o bem- -estar integral do aluno”. Tanto físico como intelectual. “Manter rotinas e criar horários foi muito importante” e, no caso dos estudan- tes do 1.º ciclo ao Ensino Secundário, foi “um dos nossos primeiros focos”. Revelou-o Ana Paulino, Professora no Colégio José Álvaro Vidal, explicando que uma das suas maiores angústias foi “ver alunos que antes passavam muito tempo na Escola, com Atividades de Enri- quecimento Curricular, confinados em casa”. Respondendo às exigências desta transversa- lidade, as Artes, a Música, o Inglês e a Educação Física nunca faltaram nos Planos de Ensino à Distância de “todos os ciclos de ensino”. E isso, para além de diferenciador, foi “sem dúvida uma mais valia”. Entre ses- sões síncronas e assíncronas, os alunos man- tiveram contacto com os Docentes titulares de cada turma ou de cada Disciplina, mas também com os denominados Professores Coadjuvantes – figuras extremamente importantes no apoio e suporte pedagógico. Já na Creche e no Pré-escolar, o ritmo foi distinto. À distância, os Educadores de Infância procuraram respeitar inteiramente as dinâmicas familiares e souberam, desde o primeiro minuto, que o ensino teria que ser articulado. A “relação afetiva” e a centra- lização de objetivos na “criança competente” orientaram as atividades propostas que, como não poderia deixar de ser, foram pensadas para a utilização exclusiva de materiais que “existem em todas as casas”. O desenvolvi- mento saudável, o crescimento pleno e a valo- rização das tarefas diárias direcionaram a descoberta e uma continuação de desenvol- vimento harmonioso, tanto quanto possível. “Foi essencial transmitir aos pais que todas as atividades propostas, por mais simples que se apresentassem, contribuíam para o pro- gresso da criança. Desvalorizam-se muito as tarefas do dia a dia e foi aí mesmo que nós nos focámos”, explicou Ana Isabel Barroso, Educadora na Fundação CEBI, a trabalhar com um grupo da faixa etária dos 2 anos. Se o ritmo de trabalho aplicado a cada valên- cia foi distinto, a preponderância e equilí-

Oferta educativa diferenciada, ritmos distintos. Mas necessariamente o mesmo suporte familiar

Uma Escola só entre os alunos e os Professores é manifestamente insuficiente.

A multiplicidade de experiências sempre foi uma mais valia da Escola da CEBI. Por isso mesmo, a supressão das atividades letivas

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Pedro Oliveira, Diretor Pedagógico do Colégio José Álvaro Vidal

Da esquerda para a direita, Educadora Ana Isabel Barroso, Ana Paulino, Professora de 2.º e 3.º ciclos e Carla Alves, Professora de 1.º ciclo.

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Ricardo Reis, Presidente da Associação de Pais do Colégio José Álvaro Vidal

brio necessários a nível familiar foram, em todos os testemunhos recebidos, fundamentais. “Criámos elos de confiança muito importan - tes para o futuro”, explicou Pedro Oliveira, quando descrevia a “relação fortificada entre alunos, família e Professores”. A certeza de que “a Escola só entre os alunos e os Profes- sores é insuficiente” foi sempre reforçada nos discursos da Presidente do Conselho de Admi- nistração da Fundação CEBI. Para Ana Maria Lima, “este triângulo é, sem dúvida, funda- mental para o sucesso da Educação”. No entanto, sobre este período singular, Carla Alves, Docente do 1.º ciclo, foi ainda mais longe: “foi extremamente importante o esta- belecimento de uma segurança inabalável entre pais e Professores. Quando os Encarregados de Educação acreditam no nosso trabalho, é muito mais fácil sentirmos confiança na resposta que estamos a dar”.

José Álvaro Vidal, “o apoio dos pais ape - sar de muito importante, poderá não ser sufi - ciente”. Acrescentou, ainda, que “algo que une os Encarregados de Educação e os próprios alunos, é a vontade que todos têm de que tudo volte à normalidade”. Enquanto os Professores se debatiam para “não deixar nenhum estudante para trás”, as famí- lias viveram com receio “de que os seus filhos estivessem a perder uma fase importante da sua vida, no que diz respeito ao contacto e à socialização”. Porque a Escola, enquanto espaço físico que se faz de (muitas) pessoas, permite isso mesmo: “o crescimento pessoal e coletivo e o relacionamento emocional e afetivo com os amigos”. Se, efetivamente, “o modelo virtual não está esgotado e é positivo”, a verdade é que todos são coincidentes na opinião de que este “nunca terá o mesmo potencial do ensino presencial”. A apreensão sobre um ensino exclu- sivamente à distância, ou a eventual hipótese de um modelo híbrido de aprendizagem, é notória entre pais e Professores. Até porque, já sabe- mos, a Escola não se esgota apenas na simples aquisição de conteúdos. E aqui, foi Ana Paulino quem ajudou a esclarecer: “a Escola é aprendi- zagem social, está nas relações, no confronto de ideias, no debate, na dialética”. A Escola é um conjunto de aquisições que exigem presença física. E agora, todos conseguem interiorizar isso muito mais. Em casa, levantaram-se, ainda, outras inquie- tações, relacionadas sobretudo com a desi- gualdade no acesso à Educação. A começar pelo facto de “cada casa ser uma casa e cada família ser uma família”. O acentuar dessas diferenças e a possibilidade da Escola física deixar de ser, ainda que temporariamente, o porto seguro de tantos quanto acolhe, causou muita apreensão e alguma ansiedade. A bar- reira imposta por um ecrã de computador não podia, de todo, fazer emergir uma “figura de Professor que não fosse suficiente para moti - var, ajudar e incentivar”. O receio, prin- cipalmente dos pais, espelhado por Ricardo Reis, era que “nesse período, também os alu- nos pudessem perder a motivação e a capaci- dade de ultrapassar todas estas novas condi- cionantes no seu processo de aprendizagem”.

Professores debatiam-se diariamente para “não deixar nenhum estudante para trás”

A Escola é aprendizagem social, está nas relações, no confronto de ideias, no debate, na dialética.

A exigência do acompanhamento foi “cansativa” e teve, logicamente, um período de “adapta- ção”. O equilíbrio numa casa que, para além de escritório, teve também que ser transfor- mada em Sala de Aula, não foi tarefa fácil. Um desafio que teve de ser gerido quase minuto a minuto. Porém, de acordo com Ricardo Reis, Presidente da Associação de Pais do Colégio

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necessário ter em consideração as competên- cias adquiridas”. Pedro Oliveira exemplifi - cou: “todos os Professores tinham consciên- cia que as tarefas realizadas em casa podiam ser feitas com a ajuda de pesquisas. Mas todos tiveram também que reconhecer que isso pode ser ainda mais exigente!”.

Desta experiência, cujos protagonistas sen- tiram de forma ímpar, também se retiraram aspetos muito positivos. Para Ricardo Reis, “foi um privilégio participar ainda mais de perto no crescimento dos nossos filhos, aju - dando-os na construção do seu conhecimento”. Como Professores, para além de um desafio pro - fissional singular, onde, apesar das circuns - tâncias, Programas e Objetivos Curriculares não puderam ser esquecidos, “tivemos que des- pir a roupagem protótipo” e, pela primeira vez, “usar mais o verbo aprender do que ensi- nar”. Lembrou Carla Alves, Professora do 1.º ciclo, mas o sentimento foi partilhado pelos restantes colegas Professores, mesmo lidando com grupos etários distintos. Este positivismo também se estende ao momento da avaliação. “Neste aspeto, acho que só ganhámos. Foi muito mais enriquece- dor”, explica o Diretor Pedagógico. E porquê? “Porque todo o trabalho conta! Deixámos de avaliar a evolução dos alunos apenas durante os 90 minutos do teste escrito”. O Ensino à Distância duplicou os momentos avaliativos e os Critérios foram necessariamente ajustados a essa fase – com intuito de nunca prejudi - car os estudantes, cuja evolução e cresci- mento tinham de ser valorizados. Mesmo que o contexto de Sala de Aula fosse vivido “em casa”. Mais do que avaliar conteúdos, “foi Mais do que avaliar conteúdos, foi necessário valorizar as competências adquiridas Deixámos de avaliar a evolução dos alunos apenas durante os 90 minutos do teste escrito e todo o trabalho contou.

Estamos todos mais ligados do que nunca

As aventuras criativas a que o Colégio José Álvaro Vidal nos tem vindo a habituar, multiplicaram-se.

A certeza de que ensinar é desenvolver as capacidades de cada Homem ou Mulher, indivi - dualizando-o enquanto Ser Humano, ficou ainda mais clara. A preocupação em manter valores humanísticos e pilares educativos, no con- texto de uma realidade completamente alte- rada e em constante mutação, foi comum à Comunidade Escolar. A luta pela atenuação das desigualdades, provenientes de uma rela- ção de ensino e aprendizagem exclusivamente digital, intensificou-se. E as aventuras cria - tivas a que o Colégio José Álvaro Vidal nos tem vindo a habituar, multiplicaram-se. Em tempo de distanciamento social, promoveu- -se a continuidade pedagógica e criou-se um universo singular de trabalho online . Pos- sibilitou-se novos tempos de experimentação com significado, através de propostas estimu - lantes e alinhadas com a visão de Escola que já existia no Colégio da CEBI. Suscitaram-se emoções, testaram-se competências e reforça- ram-se capacidades criativas. “Pela primeira vez, encerrámos um Ano Letivo sem verdadeiramente nos despedirmos, sem estarmos juntos e sem socializarmos”. Para Pedro Oliveira, esta foi, talvez, “a maior quebra psicológica nos nossos alunos”. As últimas “aulas síncronas à distância foram muito complicadas em termos emocionais”. Mas, sem existir uma estratégia nesse sen - tido, terminou-se um Ano Letivo mais unidos do que nunca! DC

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10 Nada substitui o papel da família na vida dos utentes “NADA SUBSTITUI O PAPEL DA FAMÍLIA NA VIDA DOS UTENTES” Veja aqui um resumo desta entrevista

A cuidar diariamente de uma das populações mais vulneráveis, a equipa do Departamento de Acolhimento e Apoio a Idosos (DAAI) da Fundação CEBI viveu momentos de angústia, preocupação e dificuldade neste período de pandemia. “Esta é uma Casa muito grande”, começou por lembrar a Diretora Matilde Gonçalves, acrescentando que “foi necessário adaptar toda a estrutura a um Plano de Contingência, gerir infor- mação e comportamentos com a Equipa Técnica e Operacional e garantir a revisão e alteração de algumas rotinas, através da implementação de novos procedimentos”. A pressão foi grande. Porque a responsabilidade também é imensa. Para além da adaptabilidade necessária, “a suspensão das visitas dos familiares e do serviço de Centro de Dia foram, sem dúvida, motivos de preocupação acrescida”. Não havia, de facto, outra forma de fazer, até porque a segurança sempre foi a prioridade, mas era necessário garantir que não se perdiam vínculos e referências. “Nada substitui o papel da família na vida dos utentes”, clarificou Matilde Gonçalves, garantindo que “uma videochamada não basta” para atenuar a falta da presença física. Ainda assim, reconhece-se que “os meios tecnológicos foram uma mais valia”, embora tenha sido necessário um reajuste grande nesse sentido. Ana Rodrigues, Assistente Social do DAAI, recordou que estas “não eram ferramentas do dia a dia profissional e, sobretudo, este não era um modelo com que os utentes estivessem familiarizados”. Uma gestão emocional difícil e desafiadora, principalmente “nos quadros demenciais, ou seja, junto de utentes que já não estão orientados nos três principais eixos: o tempo, o espaço e a pessoa”. Dentro do possível, e de forma adaptada às capacida- des cognitivas de cada um, foi “necessário desmistificar o que estava a acontecer, estabelecer pontes e contactos e fazê-los percecionar a mensagem”. A união e profissionalismo dos 80 Colaboradores do Departamento foram essen - ciais para ultrapassar com sucesso os primeiros meses, e mais difíceis, da pan- demia. “Sem exceção, mais do que nunca, sentimos que estávamos todos a trabalhar para o mesmo fim”, explicou a Diretora. “Proporcionar diariamente a melhor prestação de serviços possível aos nossos utentes” foi e será o foco. Claro que, situações extraordinárias requerem medidas e cuidados de exceção. No DAAI não foi diferente – “houve uma pressão colossal a todos os níveis, principalmente junto daqueles que trabalham com Idosos”, admitiu Matilde Gonçalves. Para além dos cuidados redobrados na higienização, passaram a fazer parte da rotina de todos os trabalhadores um conjunto de procedimentos que Matilde Gonçalves acredita que “vão ficar para sempre”. A capacidade de adaptação esteve no centro de todas as decisões e as determinações colocadas em prática ao longo deste período Equipas Técnicas e Operacionais são “ponto de equilíbrio” para Idosos Adotaram-se procedimentos que vão ficar para sempre.

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Ana Rodrigues, Assistente Social

Matilde Gonçalves, Diretora do Departamento de Acolhimento e Apoio a Idosos da Fundação CEBI

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N a d a o papel da foram articuladas com as Ajudantes de Ação Direta – “não houve sábados, domingos ou feriados. Os turnos passaram a ser de 12 horas, para minimizar o número de entradas e saídas da Instituição. Sabíamos que, com as visitas externas suspensas, também nós estávamos obrigados ao dobro dos cuidados”, explicou a Diretora do DAAI, certa de que “temos uma equipa espetacular”. A mesma opinião foi partilhada por Ana Rodrigues. Para a Assistente Social foram “a união, o espírito de equipa e a envolvência de todos” que permitiram “que o trabalho fluísse” como era desejado. “Não baixámos a guarda”, lembrou, “soubemos desde sempre que este era o momento para estarmos em sintonia, ainda que com vários receios”. Manter o equilíbrio emocional de todos os Colaboradores também não foi tarefa fácil. Foi Ana Rodrigues quem explicou: “somos humanos e, apesar de estarmos habi- tuados a lidar com a vulnerabilidade, a verdade é que numa situação como esta todas as emoções vêm à tona”. Por isso, “foi preciso gerir estados emocionais de grande complexidade”, até porque, “nós acabamos por ser o ponto de equilíbrio dos utentes”. Um dos dias que recordam com “maior aperto” chegou com três resultados posi- tivos em utentes. Todos os Profissionais rapidamente colocaram em marcha os proce - dimentos necessários para evitar a propagação do vírus. E assim foi. três resultados positivos Rapidamente se aplicaram os procedimentos necessários para evitar a propagação do vírus. E assim foi.

Nenhum outro Idoso ou Colaborador teve sintomas e os três casos positivos acabaram por recuperar. “Felizmente”, indicou Matilde Gonçalves. “Tínhamos na Clínica de Medicina Física e de Reabilitação da Fundação um espaço com 20 camas articuladas, para alguma situação de maior emergência. Nunca houve necessidade de recorrer ao espaço e as camas até já foram transferidas para as nossas instala- ções”, acrescentou.

Visitas suspensas obrigaram a um maior foco nas rotinas internas Nos últimos meses, alargou-se o número de pessoas a quem se presta ajuda no domicílio.

vida dos Com o Centro de Dia suspenso foi necessário, também, continuar a prestar cui- dados aos Idosos que antes procuravam esta oferta, possibilitando assim a permanên- cia do utente na sua residência, mas com serviços específicos de apoio – “acabámos 14

substitui família na por alargar o número de pessoas a quem prestamos ajuda no domicílio, nomeadamente para serviços de higiene pessoal e entrega das principais refeições do dia”, expli- cou a Diretora. Em situações como estas, “foi também essencial que serviços como a Manutenção e a Lavandaria continuassem a funcionar em pleno”, afirmou. A estrutura fundacional, uma vez mais, fez toda a diferença na intervenção prestada. E as rotinas? Com todos os constrangimentos, como se manteve alguma normali- dade junto dos utentes? “Nesse aspeto, tem muito mérito o trabalho da nossa Educa- dora Social e da Terapeuta Ocupacional”, admitiu Ana Rodrigues. Para a Assistente Social do DAAI, encerrados os contactos com o exterior, foi necessário não que- brar as rotinas internas – “tentámos que aquilo que dependia apenas de nós fosse mantido, com o objetivo de não haver um sentimento de anulação de tudo o que era normal”. Mesmo assim, é certo: “a vida de alguns utentes mudou drasticamente, prin - cipalmente para aqueles que tinham uma atividade quase autónoma e saiam muito da Instituição durante o dia”, garante Matilde Gonçalves. A reabertura ao exterior: o coração não podia superar a razão” “havia uma necessidade de toque e de afeto muito grande”. u t ent e s “Estes tempos não são só uma pandemia do ponto de vista de Saúde Pública”, garantiu a Assistente Social, relembrando de imediato que “no fundo, estamos já a presenciar e a viver uma pandemia do ponto de vista social”. O futuro prevê-o com uma necessidade muito grande de reinventar modelos de atuação: “o receio com que vivemos tem de ser transformado em motivação para delinearmos novas estratégias”. Apesar de concordar que “não sabemos muito bem o caminho que ainda vamos percor- rer”, acredita que “o maior desafio que se impõe passa por encontrar forma de não desvincular as famílias aos utentes, mas não as ter tão próximas fisicamente como desejaríamos”. DC 15 A reabertura das visitas presenciais era, por todos os constrangimentos que a sua suspensão implicou, um momento muito esperado. Restava prepará-lo com o maior dos cuidados, sabendo que “havia uma necessidade de toque e de afeto muito grande”. Independentemente de tudo, o coração não podia superar a razão. “Procurámos limitar o mais possível o acesso ao interior das instalações e, por isso, criámos um espaço de visitas na antiga receção”, explicou Matilde Gonçalves. Separados por uma estrutura de acrílico, que assegura o distanciamento e contacto social, os participantes na visita nunca se cruzam – “temos pontos de acesso distintos para os utentes e para as famílias”, revelou a Diretora.

TORNAR a realidade numa paleta de cores sem fim. Com afeto e amor, por favor.

“Tivemos sempre uma preocupação muito grande em transmitirmos segurança, confiança e esta - bilidade”, começou por explicar Olga Fon- seca, Diretora do Departamento de Emergên- cia Social, ainda que “a desdramatização da situação que estávamos a viver” tivesse que ser “consciente, responsável e com uma narra- tiva adequada a cada idade”. Os porquês nunca deixaram de existir. Mas também nunca ficaram sem resposta. “Era preciso tranquilizar as crianças e explicar-lhes o que estava a acon- tecer”. Até porque, se é verdade que a Casa de Acolhimento da CEBI é o lar das crianças Foi preciso tranquilizar as crianças e explicar-lhes o que estava a acontecer. De forma consciente e responsável. Quando a Casa se transforma no único espaço disponível

Coordenar, comunicar e confiar. Foi com estas três premissas que o Departamento de Emergên- cia Social (DES) da Fundação CEBI reinventou a sua atuação durante o período de pandemia, não perdendo de vista a necessidade de pro- teção de todos os que fazem parte da sua Casa de Acolhimento. A gestão foi “bastante com- plexa” pois, para além das necessárias adap- tações do espaço físico e no funcionamento do serviço, foi preciso não perder o foco nos 30 Projetos de Vida que, logicamente, não podiam parar. O trabalho foi acrescido pois multiplicaram-se o conjunto de emoções e sentimentos para gerir. Entre as crianças acolhidas, cuja normalidade o Covid-19 vol - tou a abalar, como também, junto de toda a equipa adulta e profissional, que foi incan - sável e que demonstrou um verdadeiro sentido de comprometimento e missão. A Casa, essa, não deixou em tempo algum de ser equilíbrio e bem-estar, um porto seguro que continua a dar colo, a tranquilizar e a encher de esperança.

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que aqui estão institucionalizadas, não nos podemos esquecer que “a normalidade do seu dia a dia também incluía saídas e visitas” exter- nas à Fundação. De repente, tudo isso deixa de existir. A Casa transforma-se também em Escola, as conversas com o exterior acontecem através de um ecrã e a gestão diária de uma “família tão numerosa” ganha novas vertentes. Claro que todas as mudanças, tão repentinas, tiveram impacto “na oscilação das emoções e dos comportamentos destas crianças”, que “não compreendem e ficam assustadas”. Revelou-o Olga Fonseca, esclarecendo que, nesses momentos, “é preciso proceder à reorganização cognitiva dos pensamentos mais desajustados, ajudando-as a lidar com o medo”. Houve, por isso, um longo processo pedagógico associado ao processo psi- cológico, até porque, durante o período de pandemia “aconteceu mesmo de tudo”!

A consistência da resposta avaliava-se, também, por isso mesmo: era muito importante garantir que todos os profissionais estavam alinhados com a estratégia interventiva. As situações mais críticas, recordam, foram aquelas “em que tivemos que reavaliar tudo o que fazíamos até então” porque “as estra- tégias que usávamos normalmente não serviam para ultrapassar todas as condicionantes que estávamos a viver”. As afirmações são de Filipa Marques, Educadora da Casa de Acolhimento, mas são transversais a todos os profissionais do Departamento. E que situações foram essas? Dois processos de adoção, três novos acolhi- mentos e o falecimento da mãe de três crianças institucionalizadas. Esta última, “uma situa- ção dramática que teve de ser acompanhada de forma muito próxima e cuidada”, explicou Olga Fonseca. “Foi preciso ajudar estas crianças a fazerem o seu luto num período que já era, só por si, catastrófico”. Os Projetos de Vida são a razão de existir da Casa de Acolhimento

Reinventar. Redesenhar. Reavaliar.

Deixaram de existir horários ou dias da semana. E garantiu-se que todos os profissionais estavam alinhados com a estratégia interventiva.

Mesmo em plena pandemia foram fechados dois processos de adoção.

A reinvenção foi diária e vivida ao instante. Os desafios profissionais, tanto para a Diretora como para os Técnicos da Casa de Acolhimento, foram singulares e dificilmente repetíveis. Multiplicaram-se as “situações trabalhosas” e a gestão foi, talvez, “a mais complexa que alguma vez já se teve nesta Casa”. Deixou de haver horários ou dias da semana. Confiança e dedicação foram palavras-chave. E estas forças tiveram que ser constantemente transmitidas aos Cuidadores, que estiveram sempre na primeira linha de atuação junto das crianças acolhidas.

O foco e o motor de desenvolvimento da Casa de Acolhimento não deixaram de ser, em momento algum, os Projetos de Vida de todas as crian - ças. Isso fez com que, durante o período de pandemia, tivessem sido fechados “dois proces- sos de adoção, com muitas particularidades”. A Diretora do DES explica: “estivemos numa altura atípica onde tudo o que teve que ver com a transmissão de emoções estava limitado”,

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Da esquerda para a direita, André Ferreira, Psicólogo, Josiane Avelar, Assistente Social e Filipa Marques, Educadora

Olga Fonseca, Diretora do Departamento de Emergência Social da CEBI

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comparando os procedimentos como uma “espécie de parto à força”. Para os técnicos da Casa, esses foram, também, “os momentos mais preo- cupantes”. André Ferreira, Psicólogo, escla- receu que “os processos de vinculação entre as crianças e as famílias foram geridos sem toque e sempre com Equipamentos de Proteção Indivi- dual” – um conjunto de tensões extra para as crianças que “tinham ali a sua hipótese de ter uma família”. “Também os momentos em que nos chegaram pedi- dos de acolhimento foram muito difíceis de gerir”, afirmou Josiane Avelar, Assistente Social, justificando que “se há um pedido des - tes, é porque alguém precisa de proteção”. E nesta Casa, seja a que horas for, “é dado sequência”. No entanto, em tempos de pande- mia, cada acolhimento previa um período de 14 dias em isolamento, o que implicava duas adaptações à instituição – “tivemos que pen - sar como podíamos atenuar este impacto”. O reflexo destes constrangimentos chegou, tam - bém, à própria equipa: “se durante os primei- ros 14 dias da criança na Casa nós não estamos com ela, como vamos começar a trabalhar o seu processo?”, questionou Filipa Marques. Redesenharam-se “os jogos de transmissão de afeto” A eficiência da resposta continuou sempre lá, mesmo quando “não se podia tocar, dar um colo ou um beijinho”. Dentro de portas manteve-se, na medida do pos- sível, a normalidade. Houve até alguns ganhos positivos, motivados pelo “pé de igualdade” ímpar em que todas as crianças se reviram. “A rotina igual para todos foi muito importante

porque veio ajudar a apaziguar algumas insta- bilidades, motivadas pela constante mudança”. Momentaneamente, “houve um equilíbrio dis - tinto”, explicou Josiane Avelar, enquanto o Psicólogo da Casa de Acolhimento foi um pouco mais longe. Para André Ferreira, “esta situação potenciou algumas características que já esta- vam presentes, como por exemplo a entreajuda e a autonomia”. Fomentou-se, com o apoio e estímulo dos Cuidadores, “a ajuda ao próximo” e cresceu a independência “nas pequenas coisas”, parti- cularidade “muito desenvolvida nestas crianças pelo facto de estarem institucionalizadas”. O afeto é regra basilar nesta que é uma Casa que protege e cuida. Uma espécie de “espaço reservado” para todos os que lá moram. O con- tacto não deixou de ser próximo, mas, mais do que nunca, era necessário não baixar a guarda da segurança. Como se fez? Reinventou- -se. “Este período foi exatamente sobre isso – retificar, repensar e alterar as estratégias que já conhecíamos, que sabíamos que funcio- navam”, mas que, de repente, “precisavam de ser ajustadas”, explicou Filipa Marques. A efi - ciência na resposta continuou sempre lá, mesmo quando “não se podia tocar, dar um colo ou um beijinho”. Redesenharam-se, por isso, “os jogos de transmissão de afeto” e deu-se ainda mais importância às palavras, “que são para se dizer, para se transmitir”. Olga Fonseca reitera: “podemos sempre dizer que te adoro e que tenho saudades tuas. As palavras nunca são demais. Não substituem o mimo mas fazem uma diferença muito positiva. Nesta Casa, isto sempre foi fundamental”. Adaptabilidade Hoje, tudo está completamente interiorizado e todos sabem que as regras são essenciais para se manterem seguros.

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As ações básicas de garantia de segurança pas- saram a fazer parte do novo normal. Ainda que a informação fosse gerida a pouco e pouco, a verdade é que, passo a passo, os cuidados de higiene redobrados e o uso da máscara passaram a fazer parte do dia a dia. A necessidade de manter o distanciamento social é que acabou por ser a orientação mais difícil de cumprir – “estamos a falar de crianças, é quase con - tranatura pedirmos para que não estejam jun- tas”, explicou a Equipa Técnica. Tudo o resto, foi implementado com a ajuda da estrutura de estabilidade que já existia e, claro, “tra- balhado de forma lúdica”. Hoje, tudo “está completamente interiorizado e todos sabem que as regras são essenciais para nos mantermos seguros”. A adaptabilidade foi característica funda- mental durante este processo – “a ideia era sempre implementar, atualizar, rever e fazer melhor”, afirmou a Educadora da Casa de Aco - lhimento. Até porque, acrescenta, “era neces- sário cantarolar a realidade e torná-la numa paleta de cores sem fim, sem nunca deixar de ser sinceros e verdadeiros sobre o que estava a acontecer”. Por isso, para algumas das crianças mais novas, “o Covid é um vírus que não pode estar connosco porque nós não temos a vacina necessária para ele não nos magoar. Ele não nos quer fazer mal, quer apenas saltitar nas nossas mãos, mas ainda não pode”.

A atitude positiva, mesmo durante as adversi- dades, foi transversal a todos os momentos, bem como a transparência na atuação. Posições também adotadas pela estrutura fundacional, essencial para ajudar a responder às necessi- dades emergentes na Casa de Acolhimento. Olga Fonseca não deixou de salientar: “tive que tomar decisões muito difíceis, mas nunca dei- xei de ter apoio da Administração e do Diretor Geral para as sustentar”. Revela que “mesmo na ausência física, houve uma ligação muito inte- ressante entre todos”. O espírito de cooperação, consciência e neces- sidade, associado ao foco na missão da Funda- ção, levaram a colaborações muito estreitas, principalmente para “criar condições para que as crianças continuassem a ter aulas e a manter os horários escolares”. Enquanto os profissio - nais do Colégio José Álvaro Vidal e do Depar - tamento de Sistemas de Informação “forneciam e preparavam todos os materiais e espaços” para transformar a Casa também numa Escola, algumas Ajudantes de Ação Direta do Colégio prontifi - caram-se “para ficar na Casa de Acolhimento, ajudando a manter as rotinas, que são muitas e diversificadas”, explicou Olga Fonseca. Este suporte, aliado à velocidade com que tudo acontecia, obrigou a que não houvesse espaço para o medo. André Ferreira explica: “toda a nossa energia, pensamento e sentimento foram canalizados para a implementação de tudo o que era necessário”. Temem-se, isso sim, “os próximos tempos”, onde se antevê um aumento de necessidade no aco- lhimento. “Espero que não, que esteja muito enganada”, desejou Olga Fonseca, alertando ainda assim para a quantidade de situações que poderão emergir “causadas por disfunções em famílias que estiveram fechadas, no mesmo lar, durante tanto tempo”. Na Casa de Acolhimento da CEBI reforçou-se a importância do afeto. E isso será algo que ficará vincado para o resto dos dias. DC

“Mesmo na ausência física, houve uma ligação muito interessante entre todos”

Toda a energia, pensamento e sentimento foram canalizados para a implementação de tudo o que era necessário. Em tempo recorde.

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Veja aqui um resumo desta entrevista

A prevalência de uma rede social de suporte INTERVENÇÃO SOCIAL E COMUNITÁRIA

No Departamento de Intervenção Social e Comunitária (DISC) da Fundação CEBI intervém-se diariamente junto de “uma população com muitos fatores de risco”. São por isso diversos os desafios que se impõem à criação de respostas multidimensionais, articuladas e sistémicas. A pandemia gerada pela Covid-19 veio juntar-se a esse conjunto de fatores de risco, agudizando fragilidades, acumulando riscos e precipitando processos e pedidos de ajuda. Instável e frágil, assim é a Comunidade de utentes e famílias que o DISC serve – caracte - rísticas potenciais para o agravamento de situações que já não eram fáceis porque “as popu- lações que são mais afetadas em contexto de pandemia são aquelas que, de facto, já eram as mais vulneráveis”. Num encontro com Isabel Castanho e Nuno Rocha, Diretora e Diretor Adjunto do DISC, res- petivamente, ficou claro que os últimos meses foram vividos com “um enorme sentido de adap - tabilidade”, tal como aconteceu com as diversas valências da Fundação CEBI. No entanto, “o trabalho de proximidade e a essência da relação com os utentes não se alteraram em momento algum. A crise para nós não é novidade, lidamos com ela frequentemente. Fomos obrigados a introduzir mais esta variável no nosso trabalho e, consequentemente, a avaliar, a agir e a refletir a partir de uma nova condição”, avançaram os responsáveis pelo Departamento.

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Permanecer sempre junto das populações de risco Reorganizou-se e fez-se um trabalho imenso de planeamento, procurando ajustar os comportamentos a tempos e espaços específicos.

A pressão positiva na resposta aos utentes, assim como o sentido de missão junto do próximo, foram essenciais para, no dia em que em que os portugueses adotavam as melhores estratégias de confinamento e começavam em teletrabalho, “a equipa do DISC continuava junto de uma população de risco e com muitos comportamentos de risco”. Os verdadeiros desafios foram exatamente esses: “manter a funcionar de forma plena os serviços essenciais do Departamento, com todos os constrangimentos associados às restrições impostas”, e encontrar dentro de cada Colaborador a motivação certa para “fazer sentido para todos” a manutenção presencial, for- temente condicionada, das suas tarefas. Não se fazia de outra forma. Mas, como se garantia a segurança de todos? “Reorganizou-se e fez-se um trabalho imenso de planeamento”, procurando a existência de tempos e espaços específicos. Tendo em conta todas as fragilidades e a própria conjuntura, “foi essencial mantermo- -nos aqui”. E é importante para todos “que nos possam sentir como a ‘rede que ampara’ em momentos difíceis”. As preocupações foram transmitidas por Mafalda Tomás e Vera Lima, Psicó - loga e Assistente Social do DISC, que não esconderam o desafio profissional ímpar que viveram. Para além dos reajustes nas funções e nos procedimentos habituais, “houve uma necessidade de estudo, de novo conhecimento, compreensão e exigência. Obrigámo-nos a sair da nossa zona de conforto, alinhando novas estratégias de intervenção”.

Aumento em 30% de pedidos de apoio alimentar durante a pandemia Uma Linha Telefónica de Ajuda Psicológica a Colaboradores, notificações por SMS aos agregados do programa de Ajuda Alimentar e recomendações para famílias em tempo de Covid-19 foram algumas novidades.

Avaliar o trabalho que estava a ser feito e antecipar novas necessidades que pudessem surgir foi o foco. É sempre. Mas, em plena pandemia, vivia-se um tempo em vertiginosa trans - formação. Por isso mesmo, em plenos Estados de Emergência e de Calamidade, o DISC desenvolveu soluções especialmente pensadas para esta nova realidade – uma Linha Telefónica de Ajuda Psicológica, destinada exclusivamente a Colaboradores da Fundação, um novo formato de noti- ficações por SMS aos agregados abrangidos pelos programas de Ajuda Alimentar e um conjunto de recomendações para as famílias colocarem em prática em tempo de Covid-19.

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À esquerda Mafalda Tomás, Psicóloga, e à direita Vera Lima, Assistente Social

Isabel Castanho e Nuno Rocha, Diretora e Diretor Adjunto do Departamento de Intervenção Social e Comunitária

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O medo e a ansiedade associados ao risco de saúde, o stress profissional, o distanciamento social e as mudanças dos hábitos pessoais e familiares em espaços e tempos abruptamente altera- dos foram, entre outros, motivos suficientes para a criação dessas novas respostas, articuladas e em sintonia com a Administração e o Diretor Geral, bem como com os restantes Departamentos da CEBI. “Foram pequenos fermentos para uma composição que já lá estava”, recordaram Isabel Casta- nho e Nuno Rocha, reiterando, ainda assim, a importância destes suplementos na intervenção, que vieram, acima de tudo, ajudar na melhoria das práticas antes implementadas – “é muito interes - sante perceber que numa situação de tamanha dificuldade, todos encontrámos formas de melhorar”.

Mais de 600 pessoas abrangidas pelo apoio da CEBI

A ajuda alimentar não é mais do que a dimensão mais visível de qualquer coisa incrivelmente mais complexa. E para isso sim, importa construir respostas.

Também o número de solicitações que chegaram ao DISC aumentaram durante o período de pandemia. Em dois meses e meio, acresceram em 30% os pedidos de ajuda alimentar, sem esquecer que “um pedido de apoio destes despoleta uma solicitação mais vasta do que isso”. Atualmente, são cerca de 200 os agregados familiares que estão ao abrigo deste programa, o que corres- ponde a mais de 600 pessoas abrangidas pelo mesmo. No entanto, a ajuda alimentar, lembraram os responsáveis pelo Departamento, “é a dimen- são mais visível de qualquer coisa incrivelmente mais complexa”, por isso, “esse pedido ini- cial traz consigo um conjunto de outras necessidades que temos, depois, de acompanhar”. Os números não são estanques. Nem cumulativos. “Felizmente, há famílias que vão ganhando com- petências e autonomia, deixando de necessitar da nossa intervenção”. Esses casos de sucesso também ocorreram durante os períodos mais críticos da pandemia. Mas, na realidade, “foram raros os dias em que não chegaram novos pedidos de apoio”. De pessoas que não são anónimas. Têm um rosto e uma grande fragilidade familiar associada – “lidamos com trabalho precário, com muitos imigrantes à espera de autorização de residência e com casos de monoparentali- dade”. Situações que não são novas ou apenas características do momento que o mundo atra- vessa – “o mais peculiar neste período foi a precipitação de situações que já eram frágeis”. A distância física imposta, nos primeiros contactos e na criteriosa avaliação de neces- sidades, geraram desafios que não existiam – “colocaram-se muitas barreiras que tivemos que ultrapassar por não podermos conhecer o agregado presencialmente”. Afirmaram-no as técnicas Vera Lima e Mafalda Tomás, habituadas a um tempo em que “estar no terreno” era sinónimo de uma proximidade física que gerava imediata empatia e relações de confiança. “Obrigámo-nos a um distanciamento que é físico, mas que não pode, de maneira alguma, ser social. Repetimos várias vezes os mesmos contactos e sabemos que isso foi fundamental para continuarmos pró- ximos da Comunidade”. Mas as angústias, essas, também se acumularam. Porque as necessidades

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